Vitória Futebol Clube e Fayal Sport Club, são as equipas da Associação de Futebol da Horta (AFH) que irão disputar o “Troféu Dr. Manuel José da Silva” – Futebol Masculino – previsto para o dia 13 do corrente, sábado próximo, no Campo do Vitória, no Pico.

Eduardo Pereira, Presidente da Direcção da Associação de Futebol da Horta, explica que “a instituição deste Troféu além de permitir a preparação desportiva a duas equipas do Campeonato de Futebol dos Açores (CFA) – que nesta temporada de 2020-2021 tem como entidade organizadora a AFH – é, igualmente, uma forma de homenagear tão distinta figura, que teve uma acção singular na forma inteligente e diplomática como conduziu os destinos deste organismo”.

É de assinalar que foi este ex-Presidente que em 1932 pacificou a família desportiva faialense, propondo que todos os castigos existentes fossem amnistiados, o que foi aceite, dando início a uma nova era.

“O Troféu “Dr. Manuel José da Silva” é uma excelente oportunidade de trazermos à memória o brilhante trajecto deste homem do desporto, mas, também, da política e da educação, e a sua clarividência deve servir de modelo a todos nós no sentido de, em conjunto, trabalharmos sempre visando um bem maior: o prestígio e a dignidade da AFH, dos seus Clubes e dos seus Atletas na exaltação de um Desporto inclusivo, com regras e ‘fairplay’”, considera Eduardo Pereira.       

Manuel José da Silva repartiu muito da sua vida e dos seus esforços por estas parcelas irmãs, aspecto que vem reforçar a pertinência da criação deste Troféu, que congrega duas das 4 ilhas de abrangência (Faial, Pico, Flores e Corvo) da AFH.

A entrega do Troféu terá lugar logo a seguir ao jogo deste sábado, que terá início pelas 14h30. O acto contará com a presença do Presidente da Direcção da Associação de Futebol da Horta.

Recorde-se que já em 1933, na Acta da Assembleia-Geral nº 25, de 25 de Fevereiro, foi aprovado por unanimidade o Regulamento da Taça “Dr. Manuel José da Silva”, a ser disputada na Zona do Pico.



Retirado do Suplemento “A Horta Desportiva” do Jornal “Correio da Horta”, edição de 13 de Julho de 1933, p. 4.

Grande ligação à AFH

Manuel José da Silva colaborou na criação da Associação de Futebol da Horta, surgida a 21 de Outubro de 1930, tendo sido Presidente da Direcção deste organismo desportivo na Época de 1933-1934. A 08 de Agosto de 1934 recebeu o título de Presidente Honorário, pelo que na Sala de Reuniões da AFH se encontra afixada a sua fotografia, fazendo menção à distinção que lhe foi atribuída.

“A Associação de Football da Horta, tendo na mais elevada consideração os relevantissimos serviços prestados desde sempre à causa desportiva pelo eminente Presidente da sua Direcção, Exmo. Sr. Dr. Manuel José da Silva, e, nomeadamente o relêvo e brilho exuberantes com que tem dirigido a vida associativa durante as duas últimas décadas, mostrando sempre a sua acção pelos mais sãos princípios; definindo e marcando com inteligência, elevação e desassombro as mais claras e decididas atitudes em face dos problemas que instante e directamente interessam não d’um modo restricto o desporto local ou do Districto, mas latamente o dos arquipelagos dos Açores e Madeira, lutando abnegada e esforçadamente pelo seu engrandecimento; fazendo convergir de preferência as suas actividades na conquista do logar que ás organisações insulares, pelo seu valor, compete na disputa do campeonato nacional; fazendo-se ouvir com especial atenção nas altas esferas e interessando no momentoso assunto muitas das mais esclarecidas individualidades dirigentes ou orientadoras; conseguindo, por direito, que as suas teses tenham obtido parecer favorável da Comissão revisora dos Estatutos e Regulamentos para serem oportunamente discutidos em Congresso da Federação Portuguêsa, reivindicando, desta arte, para a Associação de Football da Horta, e só pelo seu esforço, a honra e o mérito de, pela primeira vês e com acentuado escrito, ter agitado a opinião do País no sentido de ser garantida a representação dos Açores nas provas de apuramento do Campeão Nacional e de assim ter posto a caminho da realização uma velha e legitima aspiração do desporto Insular;

E querendo, por tudo isso, a Associação de Football da Horta, em interpretação d’um sincero e caloroso sentimento da massa associativa, dar um vivo e intenso testemunho da profunda admiração e alto apreço que tributa ao peregrino talento do insigne Presidente da sua Direcção, às suas excelsas virtudes de caracter, invulgares faculdades de trabalho, meticuloso cuidado no cumprimento do dever e magnífica energia dispendida no desenvolvimento d’uma esplendida politica de relações com que quiz ainda mais ilustrar a missão que em hora propicia lhe foi confiada;

Decide que ao Exmo. Senhor Dr. Manuel José da Silva seja conferido o titulo de Presidente Honorario da Associação de Football da Horta.

A moção foi aprovada por aclamação, como foi requerido pelos Delegados dos Socios colectivos”. (Acta nº 34 da Assembleia-Geral da AFH - 08 de Agosto de 1934).

 

Homenageado pela AFH em 1934

 

Esta proeminente figura trabalhou incansavelmente para que os três clubes de Futebol da cidade da Horta pudessem ter terrenos e instalações para a prática desportiva, tendo sido homenageada pela AFH.

Em Setembro de 1934, “na sala de reuniões da Associação Comercial da Horta, gentilmente cedida pela sua ilustre direcção, se reuniram a Assembleia Geral da Associação de Foot Ball da Horta e elementos do maior destaque da vida citadina afim de prestar publica homenagem ao senhor Doutor Manuel José da Silva, prestigioso presidente da direcção da mesma associação. (…) deu entrada no salão o senhor Doutor José Maria Serafim, presidente da Assembleia Geral da Associação de Foot Ball da Horta que se fazia acompanhar pelo homenageado a quem toda a assistencia tributou fartos aplausos que se foram prolongando até que o senhor presidente pediu silencio”. (Acta nº 35 da Assembleia-Geral da AFH - 01 de Setembro de 1934).

Em Julho de 1935, a Direcção da AFH aprovou um “Voto de profundo pesar pelo falecimento do Dr. Manuel José da Silva”, ocorrida a 08 de Maio de 1935, contando apenas 43 anos de idade.

                         

Medalhão de Manuel José da Silva em São Miguel Arcanjo



Mensagem inscrita na lápide, a qual apresenta já o desgaste provocado pelo tempo: “Homenagem ao seu muito ilustre conterrâneo e mentor Manuel José da Silva do povo de São Miguel Arcanjo”

 

Fotografia: Rodrigo Caldeira

 

Em Outubro de 1993, Manuel José da Silva foi homenageado na ilha do Pico, conforme se pode ler no artigo de Francisco Medeiros, publicado na edição de 15 de Outubro do Jornal “Ilha Maior”, gentilmente cedido por David Borges.

“Com a inscrição “Homenagem ao seu muito ilustre conterrâneo Dr. Manuel José da Silva do Povo de São Miguel Arcanjo”, a lápide foi descerrada [no jardim fronteiro à Ermida de São Miguel Arcanjo] pelo filho Carlos Peixoto da Silva Raulino, convidado para estar presente, que se fez acompanhar de todos os seus familiares.



Jornal “Ilha Maior”, edição de 15 de Outubro de 1993, p. 4.

        

Percurso de Manuel José da Silva


 

“Filho de Manuel José da Silva e Bárbara Aurora da Silva, nasceu a 19 de Agosto de 1892 em Selmo, condado de Fresno, Califórnia, aquele que viria a ser, no decurso da 1ª República Portuguesa, o mais brilhante parlamentar que o Distrito da Horta elegeu para a Câmara de Deputados. Chamava-se Manuel José da Silva e, apenas com dois anos, veio residir para São Miguel Arcanjo, concelho de São Roque do Pico. Aqui fez os seus primeiros estudos, sendo aluno distinto do professor Simas Cardoso, pai do Dr. Gabriel Simas que, desde a escola primária, foi colega e amigo íntimo de Manuel José da Silva.

Em 1905 matriculou-se no Liceu da Horta, indo concluir o ensino secundário no Liceu de Ponta Delgada. Rumou depois para a Universidade de Coimbra onde frequentou os cursos de Filosofia e de Direito. Republicano desde os verdes anos do liceu, na vigência ainda do regime monárquico, Manuel José da Silva não terá concluído nenhum daqueles cursos, mas sim o do Magistério Secundário, em 1919. Mantendo sempre uma intensa actividade política, Manuel José da Silva foi professor em Lisboa, após o que desempenhou elevados cargos de governação republicana. Tomou parte em várias comissões nomeadas pelo Governo, nomeadamente na que teve por objectivo a codificação da legislação de portos e regulamentação do fundo de protecção à marinha mercante e na que se destinava a coligir e coordenar todos os documentos relativos à história dos Açores. Chefe de Gabinete do Ministro da Instrução, foi eleito deputado em 1919 e 1925, pelos círculos de Oliveira de Azeméis e da Horta, primeiro nas listas do Partido Evolucionista e depois nas do Partido Republicano Português. Com a eclosão da Revolução Nacional de 28 de Maio de 1926, que instaurou a ditadura, cessaram as actividades políticas de Manuel José da Silva. Enquanto deputado dedicou especial interesse aos problemas da Instrução e da educação. Foi grande impulsionador das Escolas Móveis e de um ensino médio mais acessível aos menos abastados e com uma finalidade mais prática do que o dos Liceus, contribuindo grandemente para a instituição das Escolas Primárias Superiores. Em 1924 empenhou-se de tal forma na extensão do ensino técnico aos Açores – que apenas existia em Ponta Delgada – que obteve junto do Ministro do Comércio, Dr. Nuno Simões (seu íntimo amigo) a publicação do diploma que criou a Escola Comercial e Industrial de Angra e a da Horta.

Esta chegou a ter pessoal nomeado e contratado e verba para o seu funcionamento; as aulas teóricas seriam, de tarde e à noite, na Escola Primária Capelo Ivens, e as aulas práticas de carpintaria e serralharia nas oficinas das Obras Públicas do Porto Artificial da Horta, até que se alugasse ou adquirisse edifício próprio, estando prevista a criação de uma secção de electrotecnia para preparação de empregados portugueses para as companhias de cabos submarinos. Mas, “não foi só este o melhoramento conseguido para aqui, pelo Dr. Manuel José da Silva, que foi imolado a uma vesga e subterrânea política que se dizia regionalista!” O mesmo aconteceu ao Fundo de Fomento Agrícola, que tanto deveria ter beneficiado a nossa agricultura. Escapou “ao garrote o núcleo de investigação agronómica da Horta (…) em que foi integrada a Escola Matos Souto, transformada em escola móvel”.

Foi também Manuel José da Silva que evitou, através da sua acção na Comissão de Economia no Parlamento, a extinção do Liceu da Horta, introduzindo na Lei que fixava a frequência mínima de 80 alunos para os liceus uma “modificação que ressalvava o caso dos distritos onde não houvesse outro estabelecimento de ensino médio”. Esta hábil fórmula permitiu salvar o nosso liceu, que, aliás, foi o único a beneficiar com essa disposição.

A acção fecunda do deputado Manuel José da Silva estendeu-se igualmente a outros domínios, em especial ao da Educação Física e Desportos. Foi ele que obteve do Governo a cedência do campo de jogos do Fayal Sport Club, conseguiu para os nossos clubes o estatuto de utilidade pública, e a concessão “da cerca do governo civil para o campo de ténis do Sporting Club da Horta e o terreno do relvão da doca para campo de futebol do mesmo clube, bem como a cedência, ao Angústias Atlético Club, dum terreno junto à sua sede, onde este clube realiza no verão as suas concorridas diversões ao ar livre”.

Como preito de reconhecimento pela sua profícua actividade todos os clubes faialenses elegeram o Dr. Manuel José da Silva seu sócio honorário e aquando da sua morte em 1935 resolveram decretar luto durante oito dias, conservando encerradas, durante esse tempo, todas as suas instalações. Ajudou a fundar, em 1930, a Associação de Futebol da Horta, de que foi presidente da direcção.

Após o golpe de 28 de Maio de 1926, Manuel José da Silva manteve-se sempre fiel aos seus princípios e imutável nas suas convicções. Pagou, por isso, um elevado preço, tendo inclusivamente sido preso e deportado para Angra, onde teve residência fixa durante algum tempo. Fixou-se depois definitivamente na Horta, aqui casando com Maria Baptista Peixoto de Ávila, tendo sido pai de dois filhos, Carlos e Alberto. Tinha 43 anos quando faleceu a 8 de Maio de 1935. Mais de duas mil pessoas incorporaram-se no seu funeral, não havendo, conforme assinala a imprensa da época, “memória de tão grande homenagem prestada nesta terra, e ela traduz bem o pesar geral”, além de ter sido “a manifestação pública da gratidão que lhe era devida”.

Manuel José da Silva foi “um dos mais hábeis e importantes políticos republicanos de âmbito regional e nacional”. Em Oliveira de Azeméis, por onde foi eleito deputado em 1919, tem uma rua com o seu nome. Infelizmente, a Horta ainda não saldou a enorme dívida de gratidão que tem para com a memória de Manuel José da Silva”. (Fernando Faria Ribeiro, “Em dias passados: figuras, instituições e acontecimentos da história faialense”, p. 192).



Cristina Silveira