Jogou Futebol no Clube da sua freguesia (Atlético), mas rapidamente percebeu que tinha nascido para o Basquetebol, modalidade que foi largamente praticada até ser interrompida por uma lesão. Depois, enveredou pela Arbitragem, tendo sido juiz regional de Basket durante alguns anos. A vontade de seguir uma carreira profissional ligada à área da Saúde e o sonho de ser empresário conjugaram-se quando Rui Manuel Rosa Goulart tirou o Curso na Escola Superior de Saúde do Alcoitão e abriu o Hortafísio - Centro de Fisioterapia, que já completou 30 anos de existência. A parceria com a Associação de Futebol da Horta (AFH) dá-lhe um gozo enorme assim como o projecto de realização profissional levado a cabo no Sporting Clube da Horta no início da sua carreira de fisioterapeuta, nos saudosos anos 90.

Cristina Silveira

A proposta de parceria partiu da Associação de Futebol da Horta (AFH) e Rui Goulart – fisioterapeuta e empresário, proprietário do Hortafisio - Centro de Fisioterapia – acolheu-a com a melhor receptividade, como nos conta nesta entrevista. “Abracei com todo o gosto o desafio lançado pela AFH, designadamente pelo Presidente Eduardo Pereira e o Director Luís Paulo Furtado [actual Vice-Presidente], ainda mais porque o Hortafisio desde há muitos anos que está ligado à Traumatologia Desportiva. Na sequência desse contacto, foi celebrado um Protocolo onde constam as cláusulas do acordo firmado em 2017.

Momento que assinalou a assinatura do Protocolo entre a AFH e o Hortafisio, em Outubro de 2017, tendo sido formalizado por Rui Goulart e Eduardo Pereira (ao centro), na presença de Luís Paulo Furtado (à direita)

Ao abrigo deste Protocolo, quando há competições regionais no Faial organizadas pela Associação de Futebol da Horta o Hortafisio dá apoio e sempre que os atletas necessitam de fazer algum tratamento por lesões contraídas no âmbito da jurisdição da AFH [ilhas do Faial, Pico, Flores e Corvo] o mesmo decorre cá. É feita uma avaliação e cada atleta vai referenciado com uma pequena informação clínica da minha parte para o Clube saber que tipo de lesão é que o atleta contraiu e o tratamento que foi feito, sendo sugerido ao Clube a reintegração no treino de acordo com o que pensamos ser o mais adequado.

No que concerne aos casos mais verificados, aparece de tudo, mas talvez os entorses do tornozelo e do joelho sejam os mais frequentes e nos guarda-redes as lesões de ombro. Se tivesse de fazer um levantamento estatístico, diria que os entorses da tibiotársica e do joelho são os que lideram o ‘ranking’”.

Formar e informar as Selecções da AFH para a prevenção e tratamento de lesões

Dois Torneios organizados pela AFH (2017 e 2018) em que o Hortafisio materializou a sua parceria

“No decorrer desta época desportiva [2021/2022] e sempre no contexto do Protocolo estabelecido entre a AFH e o Hortafisio, vamos iniciar algo que eu considero muito importante e que passa por trabalharmos na prevenção”, salienta Rui Goulart, que explica: “O objectivo é aproveitar a presença, no Faial, dos atletas das Selecções da Associação de Futebol da Horta e dar-lhes formação e informação sobre a intervenção precoce e o tratamento de lesões desportivas em termos dos primeiros cuidados. Ou seja: pretendemos transmitir aos jogadores os cuidados que devem ter para evitar a lesão e o que fazer de imediato quando esta acontece. Trata-se de uma proposta que apresentei ao Presidente da Direcção e que foi muito bem aceite. Já na época transacta tinha abordado este assunto com o Luís Paulo e a reacção também foi a melhor.

Ainda no que concerne à Associação de Futebol da Horta, o Hortafisio também já deu apoio ao Projecto “FIFA Academy” - Centro de Treinos de Futebol Feminino, que sofreu um interregno com a pandemia, mas já se encontra de novo no activo, o que é muito bom! Como era necessário ter um fisioterapeuta de apoio, o Hortafisio prestava um serviço bastante interessante, indo todas as semanas ao treino no sentido de perceber se havia algum problema. Foi precisamente nesse ambiente que surgiu a ideia de darmos formação sobre a intervenção precoce e o tratamento de lesões desportivas, o que é decisivo no que toca à diminuição dos prazos de recuperação.

“FIFA Academy” da AFH, a seguir a um treino, em Maio de 2019. Além das jogadoras e do seu Treinador, Eugénio Botelho (o primeiro na fila da frente, da esquerda para a direita), também estão presentes Directores da Associação bem como o Presidente e ainda Rui Goulart

Está a dar-me um grande gozo esta parceria com a AFH, porque embora os atletas das Selecções sejam sempre mais ou menos os mesmos, isso faz com que seja possível criarmos alguma relação de amizade. Não nos vemos todos os dias no treino, mas, sim, de meses a meses numa Selecção. Contudo, ainda assim, com a maior parte deles já tenho uma relação de trato fácil, o que é interessante. Onde eu mais gosto de estar é no campo, porque dá-me a possibilidade de intervir, de avaliar e de viver aquela adrenalina de conseguir decidir no imediato se o atleta pode ou não continuar em jogo, sem risco de agravar a lesão ou de o colocar em cheque. Esta decisão é sinónimo de uma responsabilidade enorme, ainda mais porque estamos a falar de escalões de Formação! Por isso, reforço a importância de conhecer os atletas e a forma como funciona a cabeça de cada um. Quando se sabe o porquê daquele ‘stresse’ no início dos jogos, é mais fácil depois percebermos que determinado problema pode ter contribuído para afectar o desempenho e o resultado. Temos de conhecer o plantel e lidar com o treinador, que é quem está mais próximo deles, no sentido de nos inteirarmos sobre o estado psicológico de cada um. É um desafio aliciante! O trabalho desenvolvido pela Associação de Futebol da Horta é muito interessante e com uma missão extremamente importante, o que me leva a dizer que estou aberto a outras parcerias dentro das possibilidades da actual equipa. Neste sentido, refiro que foi celebrado um pequeno protocolo com o Clube de Ténis do Faial, que na prática funciona mais como um patrocínio do que propriamente um apoio.

No decorrer da Gala AFHorta - 90º Aniversário, realizada no dia 24 de Outubro de 2020, no Teatro Faialense, a Associação de Futebol da Horta distinguiu cada um dos seus Patrocinadores Oficiais com um Troféu. A fotografia regista o momento em que Rui Goulart foi chamado ao palco para receber o galardão do Hortafisio

Fotografia de: Roberto Saraiva

O Hortafisio não está ligado a qualquer um dos Clubes do Faial, mas penso que os mesmos têm trabalhado com alguma qualidade em termos de treino, o que é fundamental em termos da prevenção de lesões. Como tal, é crucial ir dando alguma formação/orientação aos treinadores no sentido de estes irem de encontro a metodologias de treino adequadas com o intuito de prevenir as lesões. Neste sentido, tem-se trabalhado bem no Faial. Em todas as circunstâncias as lesões são uma realidade, incluindo na alta competição, onde é feito um bom trabalho, mas nesse caso os atletas estão parados, a ganhar muitos milhões.

A grande decisão da Traumatologia Desportiva muitas vezes não passa pela recuperação, mas por aquilo que é a avaliação em campo, (…)

Quanto mais formação académica o fisioterapeuta tiver dentro da área da Saúde e maior competência técnica houver melhor, pois mais facilmente conseguirá identificar as situações e fazer um diagnóstico com maior rigor. O que nós conseguimos fazer no campo é essencialmente o diagnóstico: saber se o atleta pode ou não continuar em jogo. É ali que acontece a grande decisão. A grande decisão da Traumatologia Desportiva muitas vezes não passa pela recuperação, mas por aquilo que é a avaliação em campo, que tem de ser feita em 30 segundos, decidindo-se se o atleta pode ou não continuar a jogar.

Futebol - Torneio Inter-Associações: Selecção Sub-13 da AFH.

No Torneio que se realizou de 18 a 20 de Maio de 2018, na ilha Terceira, a comitiva da AFH era composta por: Arlindo Silva, Director; Sandro Silva, Técnico/Seleccionador; Vasco Almeida, Árbitro; e Atletas: Clube Desportivo Lajense (3) - Frederico Leal, Miguel Bettencourt e Tiago Melo; Fayal Sport Club (4) - Artur Matos, Filipe Ferreira, Guilherme Goulart e Rodrigo Melo; Futebol Clube dos Flamengos (6) - Afonso Pereira, André Benfeitinho, Gustavo Picanço, Juliana Matos, Lucas Correia e Mário Gregório; e Futebol Clube da Madalena (1) - Edgar Jorge

No âmbito da parceria existente entre a Associação de Futebol da Horta e o Hortafisio, as Selecções da AFH vão passar a receber formação e informação no sentido de prevenir e tratar lesões

O massagista desportivo teve um papel importante

O massagista desportivo, na verdadeira acepção da palavra, fez o seu papel – que foi importante – e teve o seu tempo. Depois, começou a haver profissionais mais qualificados desde fisioterapeutas a enfermeiros. Ainda bem que os massagistas existiram, pois colmataram necessidades num tempo em que não havia qualquer tipo de apoio ao jogador em campo. Estamos a falar de pessoas que foram ganhando conhecimentos ao longo do tempo, até no contacto com outros profissionais de saúde, como médicos, enfermeiros e fisioterapeutas. Foram aprendendo e resolvendo algumas situações. Enquanto não houve fisioterapeutas, os massagistas faziam o melhor que podiam e sabiam. Era o que existia na altura, mas desde há muitos anos que esse trabalho está coberto por outro tipo de profissionais, com outra competência técnica e outro ‘know-how’.

A figura mais emblemática que temos no Futebol Faialense em termos de massagista é o sr. Pinho e muitas vezes partilhamos o apoio nos Torneios da AFH.  Considero mesmo ser uma mais-valia termos os dois: o massagista e o fisioterapeuta. Sem dúvida que a experiência é muito importante, mas o resto – concretamente a formação académica – também é. Naturalmente que o facto de alguém ser fisioterapeuta não significa, por si só, ser melhor do que um massagista, mas é indispensável situarmos cada um no seu tempo e percebermos o percurso e o conhecimento de cada um”.

“A minha ideia sempre foi ter uma profissão ligada à Saúde”

Tal como acontece com (quase) todos os rapazes, também Rui Goulart passou pelo Futebol, tendo jogado (apenas) uma época e meia no Angústias Atlético Clube (AAC). Percebendo que o Futebol não era para si, mas porque não havia Basquetebol no seu Clube de coração, fez todo o percurso desportivo no Grupo Desportivo Escolar, que existia na Horta, até que uma lesão interrompeu esta dedicação. Como tal, enveredou pela Arbitragem, tendo sido juiz regional de Basquetebol durante alguns anos.

Selecção do Faial de Basquetebol que participou nos Jogos Juvenis Insulares em 1985. Rui Goulart é o segundo, à frente, da esquerda para a direita

Mas não foi este gosto desportivo que o despertou para a Fisioterapia, como recorda o próprio: “Eu gostava de ter uma profissão ligada à Saúde, mas que não fosse enfermeiro. A vocação de fisioterapeuta surgiu no 9º ano, altura em que começaram a vir ao Faial uns psicólogos que faziam testes psicotécnicos e pela primeira vez me falaram em Fisioterapia e Nutrição, duas áreas ligadas à Saúde. Um ano ou dois mais tarde, tive a possibilidade de fazer uma visita ao Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão. Percebi logo que era algo assim que queria seguir, e, no fim de Outubro de 1986, ingressei na Escola Superior de Saúde do Alcoitão, onde fiz o Curso.

Regressado ao Faial, iniciei a minha actividade profissional em Agosto de 1989, no Hospital da Horta, tendo interrompido em 1990 para cumprir o serviço militar. No início de 1991 recomecei no Hospital da Horta e em Março desse ano acumulava o Hospital com a prática privada, altura em que nasceu o Hortafisio - Centro de Fisioterapia. No ano de 2001 passei a dedicar-me, em exclusivo, à prática privada. Portanto, são 10 anos de prática hospitalar e 20 de prática privada, o que totaliza 30 anos de actividade.

Queria ser empresário na minha área

23 de Março de 1991: Momento da inauguração das primeiras instalações do Hortafisio, localizadas na Rua Conselheiro Medeiros

Concretizada a formação académica, queria ser empresário na minha área, ou seja, queria ter um espaço próprio que me permitisse fazer um trabalho que é o sonho de qualquer fisioterapeuta: a intervenção em qualidade, valorizando a relação com o utente.

No Verão de 1989 nesta área e na ilha do Faial apenas tínhamos o Hospital, que dispunha de uma única fisioterapeuta. Eu fui o segundo fisioterapeuta a trabalhar no Hospital da Horta e comecei a desenvolver o gosto por ter um centro privado, com outras valências que esta unidade de saúde não oferecia. E posso dizer que foi fácil, uma vez que tinha muita vontade de criar algo diferente no Faial para mostrar às pessoas o que era a Fisioterapia. Os faialenses estavam bastante distantes do que era a Fisioterapia, pelo que a associavam muito à massagem. Com o passar do tempo e a vinda de mais profissionais para a ilha, conseguiu-se mostrar o que era esta actividade.

Gosto de ser fisioterapeuta e da vertente empresarial. Se não fosse fisioterapeuta, teria seguido a área de Gestão, de que também gosto muito. Ao gerir o negócio na minha área profissional considero que consigo ter o melhor destes dois mundos: Gestão e Fisioterapia”.

O Hortafisio - Centro de Fisioterapia arrancou em Março de 1991, inicialmente em sociedade com o médico Fisiatra especialista em Medicina Desportiva, António Raposo, sociedade que durou até Novembro de 1993, pelo que o Centro completou 30 anos em 2021. Nessa altura e durante alguns anos, Rui Goulart trabalhou praticamente sozinho, tendo a colaboração de algumas colegas que, após terminarem o seu horário no Hospital, faziam ‘part-time’ nesta empresa.

O primeiro local de funcionamento do Hortafisio foi num edifício em frente à Caixa Geral de Depósitos, onde esteve de Março de 1991 a Março de 1993. Posteriormente, mudou-se para a Rua Conde D’Ávila, mantendo-se aí até ao Verão de 2002, altura em que transitou para as actuais (novas) instalações, no Pasteleiro, e passou a contar com profissionais a tempo inteiro.   

“O Hortafisio teve um papel importante ao mostrar o que era a intervenção da Fisioterapia no Desporto”

Há 30 anos, quando o nosso entrevistado chegou ao Faial – em 1989/1990 – estavam a ser dados os primeiros passos na Fisioterapia do Desporto. “Iniciei a minha actividade em termos de Desporto pelo Andebol, no Sporting Clube da Horta. As pessoas começaram a acreditar e modéstia à parte acho que o Hortafisio teve um papel importante ao mostrar o que era a intervenção da Fisioterapia no Desporto. Começámos a demostrar as vantagens de ter um fisioterapeuta junto dos atletas. A experiência mais enriquecedora que tive foi no Sporting da Horta e no decorrer do processo de levar o Andebol dos Regionais até à 1ª Divisão Nacional. Tive a oportunidade de fazer aquilo a que chamamos o acompanhamento longitudinal do Fisioterapeuta no Desporto: participação na programação do treino, na prevenção de lesões, no traçar do diagnóstico numa fase precoce e na fase pós-lesão designadamente a reintegração do atleta na prática desportiva normal, algo que era completamente novo na ilha.

Rui Goulart como Fisioterapeuta da equipa de Andebol do SCH de 1991/1992 até 1996/1997 tendo acompanhando o plantel desde a 3ª Divisão até à 1ª Divisão Nacional

Foi um projecto que me deu muito gozo realizar, porque estava no arranque da minha carreira e o Sporting no início da sua ascensão à 1ª Divisão. Foram anos muito enriquecedores para mim e para o Clube, na medida em que o Sporting conseguiu usufruir do meu trabalho, permitindo-me, simultaneamente, fazer a verdadeira Fisioterapia no Desporto.

Foi no Sporting da Horta que (…) me senti mais realizado

O Hortafisio nunca deu um apoio directo aos Clubes desportivos do Faial. Durante muitos anos, recebíamos atletas de todas as colectividades, procedíamos aos tratamentos e depois reportávamos aos Clubes o que tinha sido feito. Dávamos orientação, mas o treinador é que fazia o que achava melhor. Este é um tipo de intervenção. Outro foi aquele que eu tive o privilégio de fazer no Andebol do Sporting Clube da Horta, em que era parte integrante da equipa técnica. Havia a equipa técnica, os atletas e o corpo clínico, do qual fazíamos parte. Naturalmente que, quem como eu, gosta de Traumatologia Desportiva e de Fisioterapia no Desporto o acompanhamento longitudinal do atleta (acompanhar o treino, passando pela competição e acabando por ter intervenção directa no dia-a-dia do atleta, em que tudo passava por nós e é que fazíamos o encaminhamento se necessário para o médico) foi o expoente máximo da minha actividade! Foi no Sporting da Horta que, durante esses anos, me senti mais realizado. O SCH foi o projecto desportivo mais longo e mais estruturado que eu tive.

Muitos anos depois de ter vivido a sua melhor fase profissional ao serviço do Sporting da Horta, Rui Goulart vibra de novo pelo Clube por causa do filho [Flamínio], jogador de Andebol desta colectividade faialense, a qual em 2023 completa 100 anos de existência! O momento de celebração deve-se ao facto de a equipa de Iniciados do SCH se ter sagrado Vice-Campeã Nacional, em Maio de 2019

O gozo de pôr um atleta a jogar depois de uma lesão é algo único!

A Fisioterapia tem muitos aliciantes. A Traumatologia Desportiva talvez seja, para quem gosta de intervenção em patologia musco-esquelética – que é mais o meu caso e para a qual fui sempre mais direccionado desde a minha formação pós-básica e ao longo da minha carreira – o mais aliciante. O gozo de pôr um atleta a jogar depois de uma lesão é algo único! Pensar que podem ser duas semanas, mas que se conseguiu ao fim de dez dias é fantástico! E quando o atleta tem êxito a seguir, muito mais! Senti isto quando trabalhava com o Sporting! Quando se está ligado a um Clube ao longo de todo o ano consegue-se criar esta relação de empatia com os atletas, o que é extremamente importante! Um entorse da tibiotársica é diferente em cada um dos jogadores, porque todos eles são diferentes. E perceber a mensagem que se deve passar a cada um para que haja êxito na recuperação é desafiante! Lesões mais simples em cabeças mais complexas têm períodos de recuperação muito mais longos. A Fisioterapia tem este aliciante também. Entendo que qualquer fisioterapeuta se realiza na Traumatologia Desportiva, porque é realmente uma área enriquecedora.

(…) se não conseguirmos cativar o utente para a sua recuperação (…) não vamos ter êxito (…)

Sociedade “Amor da Pátria”: Rui Goulart no decorrer de uma sessão para utentes dos Centros de Convívio da terceira idade da ilha do Faial, sobre Prevenção de Quedas em idosos e Prevenção e Tratamento de Artroses, integrada na Semana da Saúde, promovida pela Associação de Pais e Amigos dos Deficientes da Ilha do Faial (APADIF) 

A vontade do utente em melhorar conta muito, desde o atleta até à terceira idade. O empenho do utente quando está a receber o tratamento é meio caminho andado para o êxito da sua recuperação. Podemos ser os melhores fisioterapeutas de sempre, podemos estar apetrechados com as melhores técnicas e equipamentos, mas se não conseguirmos cativar o utente para a sua recuperação, garantidamente não vamos ter êxito na maior parte das situações clínicas. Há pessoas que vêm derrotadas e o nosso papel também passa pela motivação. A função do fisioterapeuta não é meramente interventiva em termos de aparelho locomotor; há que encarar o utente como um todo, porque cada um de nós é, efectivamente, um todo.

Num caso de entorse da tibiotársica, se o utente demonstrar medo em dar os passos de recuperação nos ‘timings’ definidos, por mais que possamos ser efectivos nas técnicas utilizadas não vamos ter uma recuperação eficaz. E então no pós-lesão dentro da Traumatologia Desportiva há um aspecto fulcral que é o retorno à actividade desportiva, a reeducação para a actividade desportiva e aí é imprescindível a inter-acção entre o atleta e o fisioterapeuta no sentido dele saber o que é benéfico fazer. Está sempre presente o receio da recidiva. Na recuperação, uns fazem demais e outros fazem de menos, pelo que temos de encontrar um meio termo. Uns são mais receosos e não querem fazer o que já deviam para recomeçar a prática desportiva normal, enquanto que outros são mais aventureiros e como já se sentem bem vão para além daquilo que recomendamos dentro do treino limitado. Na Traumatologia Desportiva, o diagnóstico e o tratamento são determinantes, mas o retorno à actividade desportiva normal afigura-se extremamente importante. Isso passa muito pelo êxito da recuperação e de uma boa reeducação ao esforço no sentido de evitar a recidiva da lesão.

O Hortafisio está apetrechado tecnicamente e em termos de equipamento tal como acontece no Continente

Teatro Faialense, 04 de Julho de 2021: Aquando das comemorações dos 188 anos de elevação da Horta de Vila a Cidade, o Hortafisio recebeu a Medalha de Mérito Municipal Prateada pelos 30 anos da sua fundação e como reconhecimento pelo empreendedorismo empresarial revelado nas áreas da Saúde e do Bem-estar, no concelho da Horta

Ao longo destes 30 anos houve uma alteração muito significativa em termos de Saúde e de Traumatologia Desportiva, em que os ‘timings’ de recuperação têm de ser cada vez mais curtos. À nossa dimensão, tentamos acompanhar o melhor que se faz lá fora e estar ao mesmo nível de formação e com os mesmos métodos de intervenção. Estamos apetrechados, quer tecnicamente quer em termos de formação complementar pós-licenciatura com pessoal formado e equipamento exactamente como o que se faz no Continente português. Não estamos atrás de ninguém e esta é uma área em que a evolução é constante.

O nosso maior problema prende-se com a falta de fisioterapeutas. Não há no mercado português profissionais muito disponíveis para virem para o Faial e os residentes na ilha estão todos ocupados. Nos últimos anos tenho contado com fisioterapeutas do Continente português, que, infelizmente, estão sempre de passagem. Vêm com um vínculo de seis meses e acabam por ficar dois/três anos, mas depois regressam a casa. Passada a fase de aventura e de descoberta da ilha – que é um lugar simpático para conhecer e viver – querem estabilizar na carreira e voltam à origem, apesar de darmos incentivos à deslocação e de financiarmos actualizações formativas.

Rui Goulart integrou o Grupo de Fisioterapeutas que, no decorrer do 10º Congresso Nacional de Fisioterapeutas, realizado em Novembro de 2017, no Continente português, recebeu a Insígnia de Prata relativa aos 25 anos de Sócio da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas (APFisio)

Os próprios Clubes estão a sentir dificuldades em recrutar fisioterapeutas para os seus quadros. Actualmente, o Faial precisa de mais quatro ou cinco fisioterapeutas e confesso que gostava de ter mais pessoas na minha equipa, o que já aconteceu no passado. O futuro passa por ter fisioterapeutas do Continente ou do Brasil, país que, ao contrário do que se verifica noutras áreas, há já muitos anos que tem uma boa formação em Fisioterapia. Tenho conhecimento de que neste momento há alguns miúdos do Faial a tirarem licenciatura nesta área, o que me dá esperanças de que dentro de dois ou três anos o panorama possa estar melhor.

O Hortafisio faz alguns domicílios, embora não seja a sua área dominante. Quando temos mais capacidade em termos humanos e conseguimos disponibilizar técnicos para ir fazer domicílios, fazemos, mas só pontualmente. Gostamos mais que os atletas e os utentes sejam tratados no Centro.

Por norma, temos sempre lista de espera. É feita uma triagem em função da patologia e da idade. A idade e a situação clínica são critérios decisivos no atendimento prioritário, pois se tivermos a falar de um Acidente Vascular Cerebral (AVC) trata-se de uma pessoa com alguma idade; mas se estiver em causa uma patologia aguda, tanto pode ser um jovem como uma pessoa com mais idade. Temos de pesar sempre a situação clínica e a idade do utente.

A pandemia não alterou muito a nossa filosofia de intervenção. Embora nos tenha trazido restrições, a afluência manteve-se. Fomos forçados a reduzir um pouco o horário de atendimento dentro do cumprimento das regras de segurança. Tivemos algum tempo de porta fechada, dentro do que foi estipulado pela Direcção Regional de Saúde (DRS), tendo-se revelado problemático interromper o tratamento nos casos de Neurologia, que não é a nossa maior área de intervenção. Tentámos compensar a presença física com o ‘online’, mas garantidamente não é a mesma coisa.

(…) podemos ser encarados como uma “Escola”

Mais de noventa por cento dos fisioterapeutas faialenses iniciaram a sua actividade profissional no Hortafisio, pelo que, atendendo ao nosso percurso e ao acompanhamento feito aos novos profissionais, podemos ser encarados como uma “Escola”. O Carlos Garcia esteve connosco cerca de dez anos, o Márcio sete, a Joana e a Natália três e a Isabel Melo e a Tânia cinco anos. A Lúcia Matos trabalhou, em ‘part-time’, imensos anos no Hortafisio e ainda quando o último técnico se foi embora vinha ajudar-me ao final da tarde. Não há qualquer ressentimento pelo facto de todos terem procurado outras opções, pois se se criaram bons profissionais nesta “casa” – como acho que foi a maior parte – continuam a ser onde quer que estejam. Com 30 anos de experiência na área, naturalmente que isto me deixa orgulhoso e gostava de ter mais alguém do Faial, o que nunca mais aconteceu depois da Isabel e da Tânia.

No Hortafisio valorizamos a relação com o utente. Mesmo que tenhamos na nossa equipa o melhor técnico de sempre, detentor das melhores notas, se não souber comunicar com a pessoa que está a tratar não vai ter um grande êxito. Partilho do chavão de que boas escolas formam maus técnicos e de que há bons técnicos provenientes de escolas menos boas. Entendo que é possível crescer ao longo da profissão, com empenho e vontade de adquirir conhecimentos com a equipa em que estamos integrados e com uma constante aprendizagem ao longo da vida. Nem sempre há uma relação directa entre o desempenho e a formação que se traz de base. Durante alguns anos, o Hortafisio funcionou como local de estágio de três escolas do Continente: Instituto Politécnico de Setúbal, Escola Superior de Saúde do Alcoitão e Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário, CRL (CESPU) e eu notava que se tratava de formações e perspectivas de intervenção completamente diferentes. Até o discurso era diferente!

No Faial, trata-se com qualidade

Um aspecto que tenho constantemente em atenção é o futuro na profissão. Como tal, o Hortafisio proporciona sempre aos seus técnicos a possibilidade de irem ao Continente fazer formações/actualizações, visando o crescimento e a evolução na profissão e na carreira. Naturalmente que invisto nos técnicos que me dão perspectivas de ficar mais tempo, pelo que os mesmos têm dispensa de serviço contando com um incentivo monetário para formação. É uma oportunidade de valorização pessoal e profissional, em linha com o que poderiam ter no Continente, tornando-se, também, uma mais-valia para o Centro.

Além de tudo isso, no Faial dispomos das condições ideais para ser um bom profissional e que passam por tratar poucos doentes por hora, sendo possível haver um tratamento diferenciado para cada utente. Não estamos aqui a “despachar” nem a tratar a metro como acontece em muitas clínicas do Continente português, nomeadamente as que são convencionadas. No Faial, trata-se com qualidade. Investe-se na resolução do problema de cada utente.

O Hortafisio tem convenções com o Hospital, diferentes sistemas de saúde e várias companhias de seguros, trabalhando, também, de forma particular.

Por opção, o Hortafisio sempre se dedicou só à Fisioterapia

Sociedade “Amor da Pátria”: Sessão para utentes dos Centros de Convívio da terceira idade da ilha do Faial, sobre Prevenção de Quedas em idosos e Prevenção e Tratamento de Artroses, integrada na Semana da Saúde, promovida pela Associação de Pais e Amigos dos Deficientes da Ilha do Faial (APADIF) 

Se voltasse atrás fazia tudo igual: seguia a mesma área e abria a mesma empresa, com a mesma filosofia de intervenção, valorizando sempre a relação com o utente. Há muitos centros no País que juntaram a Fisioterapia a outras profissões, nomeadamente a Acupuntura, a Osteopatia ou o Bem-estar. Por opção, o Hortafisio sempre se dedicou só à Fisioterapia. Durante algum tempo, tivemos médicos que prestavam serviços no Hortafisio, mas sempre relacionados com o aparelho locomotor, com esta valência ligada à Fisioterapia, nomeadamente a Fisiatria, a Ortopedia e a Reumatologia. Nunca quisemos alargar a nossa actividade à Estética, aos Spas ou ao Bem-estar, embora a Fisioterapia seja bem-estar.

O lema da Associação de Fisioterapeutas – mais recentemente da nossa Ordem – é “Fisioterapia por Fisioterapeutas”. Pode-se fazer Massagem, Acupunctura, Osteopatia, etc., mas nada disso substitui a Fisioterapia. Cada uma tem o seu papel. Nalguns casos, uma é mais eficaz do que outra e em muitas situações complementam-se. O mesmo utente pode estar a fazer Acupunctura e Fisioterapia. São coisas distintas. Quando acho que vale a pena experimentar um outro tipo de intervenção, encaminho as pessoas para a Osteopatia ou para a Acupunctura, sempre com o objectivo de melhorar a sua situação.

Temos um bom espaço (…) que, futuramente, pode ser adaptado a outras vertentes desportivas

Já estou naquela fase em que me permito fazer aquilo de que mais gosto e as sessões de Fisioterapia são algo que me dão muito gozo. Embora esta seja uma área que tem sempre futuro, já penso que vai chegar o dia em que vou ter de reformar-me e, sinceramente, não gostava de fechar a porta daqui a dez anos. Penso que o Hortafisio poderá continuar de porta aberta alargando a saída profissional do meu filho para uma área do Desporto e, então aí sim, sentirmos a necessidade de manter um ou outro fisioterapeuta, mas alargar para a parte desportiva. A modalidade dele é Andebol e com 17 anos está na equipa profissional do Sporting Clube da Horta. Ele gosta da modalidade e de Desporto, o que poderá levá-lo a tirar uma licenciatura nalguma destas áreas. Hoje em dia há muitos cursos ligados à parte desportiva como Fisiologia do Esforço, Metodologia do Treino, etc., etc. Actualmente, as equipas técnicas têm cinco ou seis pessoas, cada uma na sua área, pelo que são diversificadas as hipóteses.

Junho de 2021 - Juvenis - Equipa de Andebol do Sporting Clube da Horta.

O gosto de Flamínio Goulart pelo Desporto, poderá fazer com que dê continuidade ao legado do pai no Hortafisio

Fotografias: Facebook da AFH e cedidas por Rui Goulart

Temos um bom espaço que não nos envergonha em lado algum e que, futuramente, pode ser adaptado a outras áreas dentro da vertente desportiva, como Manutenção, Musculação, Classes, Aeróbica, entre muitas outras alternativas. Este espaço é versátil. Como tal, o Flamínio pode fazer dele um centro ligado ao Desporto, mas mais abrangente, contemplando várias vertentes”.