Mesmo sem ter envergado o equipamento ou calçado as botas, Hernâni Manuel Nunes Furtado deixou o seu nome ligado ao Grupo Desportivo “Os Minhocas”, tendo desempenhado diferentes cargos nos Corpos Gerentes desta agremiação florentina numa altura em que foi necessário trabalhar anos a fio para saldar a dívida em que o Clube se encontrava mergulhado.

Nas vésperas de terminar quatro anos de mandato, este Dirigente – com percurso associativo no Grupo de Teatro “A Jangada”, os Bombeiros e os Lions, entre outras instituições de Santa Cruz das Flores – já aceitou o convite para continuar ao lado de Eduardo Pereira, integrando a equipa que vai a sufrágio no próximo dia 05 de Junho.

 

Cristina Silveira

           

Hernâni é um homem virado para o associativismo e o apoio social, que prefere dar o seu contributo trabalhando para resolver situações em vez de se dedicar à prática de uma ou outra modalidade e quando acha que a missão está cumprida parte para outro projecto, onde a sua ajuda se afigure mais necessária.


Lucino Lima, Cecília Estácio e Hernâni Furtado numa festa de Carnaval no Grupo Desportivo “Os Minhocas”. Recorde-se que Lucino António Semião Lima foi nomeado, a título póstumo, Sócio de Mérito da AFH por ter exercido várias funções n’ “Os Minhocas” entre as quais as de Treinador e Presidente da Direcção, tendo trabalhado de forma empenhada na recuperação financeira do Clube durante os vários mandatos a que presidiu. Além disso, também integrou os Corpos Gerentes da Associação de Futebol da Horta

 

Foi assim que começou a ligação ao Grupo Desportivo “Os Minhocas” no ano de 2008, altura em que foi convidado por Lucino Lima a integrar a Direcção. Ocupou diferentes cargos até 2016 e trabalhou afincadamente para resgatar o Clube do passivo em que este se encontrava mergulhado. “O Clube tinha uma dívida que ultrapassava os 100 mil euros e o edifício encontrava-se em hasta pública, pelo que o senhor Lucino – grande obreiro nesta colectividade Desportiva – formou um grupo de pessoas para integrar uma Direcção, tendo-me convidado para o lugar de Secretário com o intuito de eu tratar da parte burocrática e organizar festas destinadas à angariação de fundos. 


A decoração é uma área em que Hernâni põe a render os seus talentos

 

Entrei neste grupo já no seu segundo ano de trabalho e levámos a cabo uma tarefa hercúlea ao longo de várias temporadas. Trabalhou-se muito na organização de festas de Carnaval, Páscoa, Passagem de Ano, Festivais de Sopas e outros eventos, que eram muito concorridos. Quando conseguimos saldar a dívida o sr. Lucino já não se encontrava na Direcção, tendo sido sucedido no cargo pela Sra. Dora Valadão, que passou a ser a Presidente do Grupo Desportivo “Os Minhocas”. Lembro-me que as mulheres estavam em maioria nessa Direcção e eu era Presidente da Assembleia-Geral. Andei a bater de porta em porta no sentido de encontrar elementos para formar essa equipa e participava em todas as reuniões da Direcção. Foram anos de muita energia e de grande união, apesar das inúmeras dificuldades com que nos debatíamos. É nas adversidades que se nota mais união e que surgem as melhores ideias. Havia muita colaboração das pessoas e até mesmo da Câmara de Santa Cruz, que ajudou não com dinheiro, mas, sim, com materiais para a manutenção da sede do Clube e no apoio jurídico, entre outros aspectos. Nesse sentido, a autarquia ainda mantém com “Os Minhocas” um protocolo de cedência em relação ao salão de festas. E eu entendo que assim é que está certo. Quem está à frente das colectividades não deve ser apenas para gerir, mas também para trabalhar. É muito fácil gerir algo quando o Estado injecta dinheiro. Não sou apologista de se atirar dinheiro para resolver os problemas. O que é preciso é que cada um assuma as suas responsabilidades, trabalhando de forma séria”.


Aspecto do Salão do Grupo Desportivo “Os Minhocas” na Passagem de Ano de 2016. A decoração esteve a cargo de Hernâni Furtado

 

Além de Lucino Lima, pessoa que o levou a ter uma maior ligação ao Grupo Desportivo “Os Minhocas”, Hernâni também trabalhou sempre com Márcio Nóia e Valter Estácio.


Hernâni Furtado e Márcio Nóia trabalharam lado a lado no Departamento Desportivo d’ “Os “Minhocas”

 

“Neste momento, os Clubes da ilha têm uma situação equilibrada e quando saí d’”Os Minhocas”, onde dei a minha colaboração ao longo de nove anos, havia dinheiro em cofre. Deixei a casa arrumada como se costuma dizer. Nunca quis ser Presidente – cheguei mesmo a ser convidado para o Boavista Sport Clube – mas sempre gostei de colaborar, considerando que posso ser uma mais-valia. Para mim, todos são úteis conforme as suas capacidades.

O Desporto é uma escola cívica para formar mulheres e homens e quem está à frente dos Clubes deve dar o seu melhor não esperando apenas pelo financiamento, pois trata-se, também, de formar pessoas para a vida.

Naturalmente que há rivalidade entre as diferentes colectividades que, por almejarem sempre mais e melhores resultados, por vezes esquecem-se de que não vale tudo, como por exemplo aliciar atletas de outros Clubes para virem para o seu. E depois o que se vê são equipas desequilibradas.

Olhado para a nossa dimensão e para os nossos recursos, é óbvio que não se pode pensar em profissionalismo ou sequer em pagar a atletas como se verificou no passado com o Futebol de 11, o que levou à ruína e fim da prática da modalidade nalguns Clubes nas Flores e até mesmo nos Açores. Temos de trabalhar com “a prata da casa”. Pagar a uns e não pagar a outros cria divisões e numa Terra pequena isso é incomportável. Mas mesmo dentro do amadorismo há que haver ambições de evolução e crescimento.

Penso que a aposta que se fez nas Flores relativamente ao Futsal é a mais certa, pois é uma modalidade fácil de organizar e de desenvolver, com uma carga de esforço diferente. A grande implantação registada é bem a prova disso. É verdade que não arrasta multidões como o Futebol, mas já começa a cativar as camadas mais jovens e penso que é por aqui que temos de caminhar. É mais fácil arranjar uma equipa de Futsal do que uma de Futebol.

Para além do Futsal, o Voleibol é um desporto bem estruturado nas Flores, com competições locais e regionais.

Localmente, temos o Boavista, o “Minhocas” e o Ponta Delgada no concelho de Santa Cruz, estando actualmente o Fazendense [das Lajes] inactivo, situação em muito provocada pelo “desastre” que foi a Série Açores. Era importante que o Grupo Desportivo Fazendense fosse reactivado. O sonho de ser grande já mostrou às Flores que pode deitar por terra o pouco que se tem”.

 

Poucos jovens para muitas actividades

 

“O Desporto tem um papel fundamental e permite uma maior inter-acção entre as pessoas, mesmo fora de campo. Por morar na periferia nunca integrei as fileiras de qualquer Clube como atleta, mas quando regressei da Universidade – sou Técnico de Higiene Alimentar – comecei logo por dar a minha colaboração no Teatro e no “Minhocas” por entender que todos devemos contribuir. Mas claro que embora todos possam ajudar sabemos que nem todos têm capacidade para liderar. Tem de ser alguém com “mão forte”.

A ilha das Flores debate-se com falta de população, sobretudo jovens, já que no global não atinge os quatro mil habitantes e naturalmente que esta carência também se reflecte ao nível do Dirigismo, além de que, como é sabido, a juventude se encontra envolvida em diversas actividades, como os Escuteiros e a Vela, além do Voleibol e do Futsal e ultimamente o Trail tem ganho muitos adeptos. Esta última vertente envolve gente mais adulta, mas também alguns jovens, pois tratando-se de um desporto individual não implica trabalho de equipa.

Actualmente só dois Clubes é que têm Futsal e alguns contam com jogadores do concelho vizinho. Esta modalidade envolve uma logística e um investimento maiores, pelo que obriga a uma boa organização dos Clubes. No caso do Boavista e do Ponta Delgada são Clubes que estão novamente quase a começar do zero em termos de equilíbrio financeiro.

Já quanto ao Futsal, temos condições para ter uma equipa na Série Açores. Não para permanecer, mas para ganhar experiência. Temos o exemplo do Fazendense que se aguentou duas épocas na Série Açores.

Julgo que a Formação não está em risco. No entanto, não há equipas Femininas no Futsal uma vez que as atletas são bastante absorvidas pelo Voleibol devido à boa formação técnica e cívica desta modalidade. Em termos de Formação, no passado houve uma equipa mista entre os “Minhocas” e o Fazendense, mas tal não é visto como aliciante para as meninas”.


Hernâni Furtado no decorrer de uma Assembleia-Geral em que presidiu à tomada de posse de um novo elenco do Grupo Desportivo “Os Minhocas”

 

“(…) não se deve dar nada à espera de receber recompensa (…)”

 

Hernâni integrou a Direcção do Grupo de Teatro “A Jangada” e salienta que sempre que o convidam para tomar parte nos corpos directivos é para ser Tesoureiro, atendendo a que as pessoas “gostam da forma séria” como trabalha.

Na Associação de Bombeiros Voluntários de Santa Cruz esteve como Vogal da Direcção durante dois anos, mas dava apoio ao Tesoureiro; e no Lions Clube – Pérola do Ocidente – já foi igualmente Tesoureiro, funções que desempenha novamente no presente.

Com o objectivo de angariar fundos para realizar obras, aceitou dar corpo à Comissão Fabriqueira da igreja de Nossa Senhora da Conceição, em Santa Cruz, tendo ainda feito parte do Grupo de Jovens deste concelho.

A única actividade menos bem sucedida em que se envolveu teve a ver com o projecto de revitalização da Sociedade Filarmónica Dr. Armas da Silveira, para que houvesse uma segunda banda em Santa Cruz, mas “infelizmente” esse propósito não foi alcançado.

Este Dirigente considera que “não se deve dar nada à espera de receber recompensa” e que “todos merecem uma segunda oportunidade quando falham ou são incompreendidos pela sociedade”. E realça: “Sinto-me recompensado com os objectivos que foram alcançados. Não espero nada da sociedade e nos sítios por onde andei muita vez tive de injectar dinheiro do meu bolso para que as metas traçadas fossem alcançadas”.

Tendo sido criado no seio de uma família abastada e dedicada aos trabalhos agrícolas, cresceu a apoiar causas sociais a nível de ilha, que tanto poderia ser o restauro de uma peça de arte sacra como o a reabilitação de um edifício de culto. E a propósito recorda a história de profunda solidariedade e caridade cristã vivida com o seu bisavô materno que, mesmo tendo 16 filhos, um dia foi abordado por uma pobre mulher que lhe bateu à porta a pedir algo para comer. Apesar da numerosa prole que tinha de alimentar não hesitou em partir metade do único pão que sobrava em casa e dar-lhe metade, ficando a restante metade para a família, com a confiança de que no dia seguinte tudo se iria resolver.

Agricultura, jardinagem e decoração (de igrejas, festas e casamentos) são áreas a que o entrevistado dedica especial atenção, demonstrando sempre vontade em dar de si e do seu tempo quando acredita no projecto e nas pessoas.

 

“Para segurar o mundo de alguns, deixei o meu desmoronar muita vez”

 

Como Delegado da AFH nas Flores, Hernâni tem sido convidado a representar a Associação de Futebol da Horta nesta ilha e até no Corvo sempre que se afigura necessário. Este Dirigente encontra-se a terminar quatro anos de trabalho como 1º Secretário da Assembleia-Geral, na equipa de Eduardo Pereira, adiantando que já aceitou o convite para mais um mandato (igualmente de quatro anos), estando o acto eleitoral calendarizado para o próximo dia 05 de Junho.

Antes de aceitar o repto para a recandidatura em marcha, este Agente Desportivo sugeriu ao Presidente da Direcção que endereçasse convites noutro sentido por entender que “é importante dar oportunidade a que outros também participem”. “Além do mais, os que criticam devem ser convidados a participar para perceberem como é estar por dentro das organizações”, sublinha, deixando escapar que precisa de dar tempo a si próprio. “Para segurar o mundo de alguns, deixei o meu desmoronar muita vez”, admite este voluntário, cuja personalidade vincada nem sempre é encarada de frente por quem tem ideias divergentes. “Gosto de frontalidade ainda que seja criticado por isso, pois o importante é sentir que dei o meu melhor e estar bem comigo próprio, mesmo sabendo que pago um preço por ser assim”, conclui.

 

“O Presidente Eduardo Pereira é uma pessoa dinâmica”


Hernâni Furtado em representação da AFH na entrega de uma taça na ilha das Flores

 

Fotografias cedidas por: Hernâni Furtado

 

“Embora seja testemunha de que a Associação de Futebol da Horta trata as suas quatro ilhas de forma igualitária, a verdade é que por vezes alguns pensam que não é bem assim pelo facto de a sede estar implantada na Horta”, refere o 1º Secretário da Assembleia-Geral deste organismo desportivo, um profundo conhecedor da realidade e ambiente desportivo vivido na mais Ocidental ilha açoriana.

Quanto à recandidatura do actual Presidente da Direcção a um novo mandato, Hernâni considera que “ele tem capacidade para tal”, além das “facilidades existentes junto da Federação Portuguesa de Futebol (FPF). “A Federação tem uma grande consideração pela Associação de Futebol da Horta e pelo seu Presidente. Sei disso porque presenciei”, nota, salientando: “O Presidente Eduardo Pereira é uma pessoa dinâmica e uma vez que existe um projecto em marcha, designadamente a construção de uma nova Sede, Campo e Centro de Estágio, seria muito bom que ele concretizasse este seu desiderato antigo, que em muito irá beneficiar estas quatro ilhas [Faial, Pico, Flores e Corvo].

Em termos de instalações existem muitas limitações, pelo que novas infraestruturas serão sinónimo de melhores condições. Costumava participar nas reuniões da AFH (só tenho evitado isso desde que começou a pandemia), por isso tenho perfeito conhecimento da realidade desta instituição, a qual trabalha muito nos bastidores, havendo um grande peso burocrático. Não conta só aquilo que é palpável. Há muita coisa que não se vê, mas que representa muito labor por parte de várias pessoas. Mesmo sem as condições ideais, a Associação de Futebol da Horta tem feito de tudo para apoiar sempre os Clubes seus filiados.

Acho muito importante haver representatividade das quatro ilhas nos Corpos Gerentes, pois isso aproxima-nos todos, sendo fulcral colaborarmos uns com os outros. Temos de saber o que se passa em todas e cada uma destas quatro parcelas.

Esta é uma equipa unida, cujo líder é alguém com quem é fácil de trabalhar. Contudo, atendendo à natureza quadripartida da AFH, trata-se de um organismo muito difícil de gerir. Penso que é mesmo o amor à causa Desportiva que leva o Presidente a querer meter ombros a mais quatro anos de trabalho árduo, sendo louvável a vontade que ele tem de deixar obra feita no sentido de dotar a Associação de Futebol da Horta de melhores condições a todos os níveis. Todos iremos beneficiar com isso e de forma muito especial e directa as camadas mais jovens, que representam o futuro destas modalidades”.